“É possível fazer democracia com direitos humanos. É possível promover o crescimento econômico com a defesa dos direitos dos que não os têm, sem rupturas institucionais”. Essas foram as palavras que o secretário-executivo do Instituto de Políticas Públicas em Direitos Humanos (IPPDH) do MERCOSUL, Paulo Abrão, usou ao inaugurar, nesta quarta-feira (9), em Buenos Aires, a Escola Internacional da instituição.
A aula inaugural foi dividida entre o alto representante geral do MERCOSUL, Florisvaldo Fier, e o representante-geral da UNASUL, Ernesto Samper, que falaram sobre o processo de integração e os direitos humanos na sede do IPPDH, na véspera do Dia Internacional dos Direitos Humanos, celebrado hoje (10).
Florisvaldo “dr. Rosinha” Fier lembrou a Declaração de Iguaçu, assinada entre os presidentes Raúl Alfonsin e José Sarney em novembro de 1985, que reviveu a ideia da integração econômica e política entre os países do Cone Sul. Recém saídos de períodos ditatoriais, Brasil e Argentina haviam percebido a distância que os separava em termos físicos e em questões cidadãs. Aquela carta condenava a dívida externa e também a fuga de capitais, mas não citava os direitos humanos, não falava em cidadania.
Pontes – Dr. Rosinha recordou também o tempo que separa a ponte inaugurada em 1985 para encurtar a distância entre os dois países e a Decisão 64/2010, que tratado Estatuto da Cidadania do MERCOSUL e estabelece o aprofundamento das dimensões social e cidadã para a integração regional com desenvolvimento sustentável, justiça e inclusão social. “Não se pode separar o avanço econômico dos ganhos relacionados à cidadania, apesar de o MERCOSUL ainda manter uma orientação fortemente econômica.” Nesse sentido, ele questiona: “Por que as placas dos carros serão únicas e as cédulas de identidade não?”
O plano citado pelo dr. Rosinha prevê que sejam criados, até 2021, vários direitos e benefícios aos cidadãos do bloco. Sistema integrado de defesa do consumidor, facilitação docontrole migratório e aduaneiro, integração dos cadastros previdenciários e trabalhistas e uso de placa comum para veículos são alguns deles. Acordo entre os países já concede o direito à residência e ao trabalho para os cidadãos do MERCOSUL, sem outro requisito que não a nacionalidade.
Um dos problemas apontados no processo de integração é o papel da mídia, que insiste na publicização de estereótipos e preconceitos. Por isso, dr. Rosinha diz ser preciso explorar positivamente a cultura. “Temos que olhar o outro com outros olhos. A cultura do outro deve ser a nossa cultura, para que não seja uma cultura à parte.”
Identidade – Na mesma direção, Ernesto Samper lembrou que a UNASUL considera a cidadania regional como um dos principais objetivos da integração. Ele destacou que a consolidação de uma identidade sul-americana, por meio do reconhecimento progressivo de direitos aos nacionais de um Estado residentes em outro, é em busca da cidadania sul-americana.
O ex-presidente da Colômbia disse que a UNASUL nasceu com três princípios, a preservação da região dos 12 países como área livre de conflitos armados; o desenvolvimento da democracia; e a defesa dos direitos humanos.
Samper falou que somos uma região com identidade e essa identidade é mantida com a vigência dos direitos humanos, por sua vez relacionada à prática da democracia.
Ele lembrou o exercício da luta dos direitos humanos no mundo, datando-a, no século 18, contra a tirania, no 19, contra o capital, no 20, em defesa das minorias, e no 21, em defesa de nós mesmos. “Assim é que agora precisamos estar atentos às questões ambientais e da bioética.”
Samper declarou que não queremos os direitos humanos escritos em declarações, “queremos que as pessoas possam sentir e tocar os direitos humanos”. E precisamos defender nossos direitos contra os interesses globalizantes. Para servir como exemplo, ele contou a história do negócio entre a galinha e o porco, no qual este precisa rejeitar a troca de ovos por toucinho, pois a negociação para a galinha é apenas uma contribuição e para o porco, o comprometimento total.
O ex-secretário-executivo do IPPDH, Vitor Abramovich, o diretor de Direitos Humanos da Chancelaria argentina, Federico Villegas Beltrán, também participaram doevento. Abramovich disse que o processo de integração do MERCOSUL passa pela promoção dos direitos humanos e Villegas, que é necessário tempo para criar um espaço de direitos humanos na região, pois “é preciso mudar a cultura”.
Imagens do SUL – No mesmo dia, o IPPDH inaugurou seu espaço cultural, com a abertura da mostra “Olhares do Sul”, uma seleção de dez fotos sobre a diversidade da região. As imagens foram selecionadas dentre mais de 1,4 mil inscritas no segundo concurso fotográfico da Secretaria do MERCOSUL. A competição foi idealizada para reconhecer as características e a diversidade cultural dos povos da região e ressaltar a cidadania no processo de integração.
A escola do IPPDH
Centro de altos estudos responsável por organizar e desenvolver atividades de capacitação em políticas públicas em direitos humanos do IPPDH, a escola vai desenvolver propostas de capacitação que articulam conhecimentos políticos e acadêmicos em diálogo com os saberes sociais.
Oferecer a funcionários dos Estados do MERCOSUL e a atores sociais programas de formação sobre políticas públicas para garantia de direitos humanos, articulando o saber teórico e técnico com a análise empírica é parte dos objetivos da escola.
Os procesos de estudo oferecidos vão combinar a formação teórica e prática com conferências magistrais sobre iniciativas de impacto para a garantia dos direitos implementados nos Estados da região. A programação prevê cursos presenciais e a distância.
A Escola Internacional de Política Pública em Direitos Humanos integra o projeto de cooperação humanitária internacional do IPPDH implementado com o apoio doGoverno Brasileiro.